Enfrentando o Anthropoceno – capitalismo fóssil e a crise no sistema da Terra”

21/08/2016 18:51

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Amelia Gonzalez

A intenção do livro de Angus foi o que mais me atraiu para a leitura.  A virada de era, claramente um fenômeno causado  sobretudo pelo excessivo consumo de combustíveis fósseis, precisa ter um olhar sócio-ecológico, afirma o autor. A segunda parte do livro é inteiramente dedicada a essa discussão.  E, como só podia acontecer, o foco é o conflito entre crescimento e preservação.

 

“Quando os líderes dos países ricos, o G20, se encontraram em Toronto em 2010, por unanimidade eles concordaram que sua prioridade era pavimentar um forte, sustentável e equilibrado crescimento.A palavra crescimento aparece 29 vezes na declaração final do encontro.Por  que, face à evidência massiva de que a constante expansão da produção e extração de recursos está nos matando, os governos e as empresas continuam a alimentar um crescimento descontrolado?”, pergunta-se Angus.

 

Para nossa espécie, o suficiente nunca é suficiente.Estamos querendo sempre obter mais coisas, de preferência com menos trabalho. Essa constatação cria em alguns especialistas a falsa impressão de que o problema do planeta é a quantidade de pessoas que hoje o habitam.  No entanto, como o próprio Angus comprova em outro livro – “Too Many People?” –escrito com Simon Butler,  – o fato de que países com alta taxa de nascimentos geralmente têm os menores padrões de vida e produzem menos poluição fatalmente desconstrói o medo da “super população”.  E tem mais, alerta Angus: se os 3 bilhões de pessoas mais pobres do planeta desaparecessem de uma hora para outra não haveria redução alguma na contínua destruição ambiental.

 

Fato é, lembra o autor, que o sistema capitalista precisa de crescimento para sobreviver.  Se, milênios atrás, quando não havia espaço ou necessidade de crescimento econômico, quase toda a produção era para uso, sob este regime econômico a maioria da produção é para troca:

 

“O capital explora o trabalho e a natureza para produzir bens que podem ser vendidos por mais do que o custo de produção, a fim de acumular mais capital. E o processo se repete. A ideologia do crescimento não causa acumulação, mas a justifica”, escreve o autor.

 

Ian Angus também descreve o comportamento paradoxal  dos executivos das grandes empresas. Se perguntar a qualquer um, da Exxon, Shell ou Volkswagen, eles dirão que querem um futuro sustentável para seus filhos e netos. No entanto, quando estão atrás de suas mesas de trabalho, quem ganha é o capital e é a ele que terão que prestar contas.

 

“Sendo assim, quando apresentam a eles uma escolha entre proteger o futuro da humanidade e maximizar o lucro, eles escolherão o lucro.  Se a blindagem falha ou se ele ou ela tem um ataque de consciência, não vai durar muito no cargo”, profetiza.

 

Não se trata de vilanizar executivos.É assim, ou melhor, tem sido assim o sistema econômico:  se nada parar o capital, ele vai tentar se expandir indefinidamente.  Mas acontece que, para isso, vai precisar de recursos naturais. E eles não são infinitos.  Como também demonstrou o antropólogo norte-americano David Harvey, “uma economia capitalista com crescimento-zero é uma contradição, não pode existir”.  Eis aí, portanto, a raiz das causas que provocam a crise ambiental.

 

Um exemplo do que se está dizendo pode ser facilmente encontrado no agronegócio:  em vez de plantar e colher alimentos para uso, eles o fazem para vender e lucrar.

 

Claro está que Ian Angus apostanum outro regime como a chave para se sair dessa situação crônica e recorrente.  No entanto, não será uma revolução ecológica que não seja socialista, tampouco uma revolução socialista que não seja ecológica.

 

“Devemos ser pluralistas e abrir possibilidades para diferentes visões dentro da chamada ‘esquerda verde’.  Tem sido muito dito que as pessoas  dos países do Hemisfério Sul e os indígenas que vivem em todos os lugares são as primeiras vítimas das mudanças climáticas e outras formas de destruição do meio ambiente. O que não é dito, mas é muito mais importante dizer, é que os primeiros criminosos ambientais são os ‘nossos’ capitalistas do Norte. Isso põe uma responsabilidade especial nos ecosocialistas dos países ricos para combater as políticas de nossos governantes e das corporações baseadas em nossos países”,  escreve Ian Agnus.

 

O autor acredita que somente uma oposição de massa feita por pessoas bem informadas é que poderá trazer alguma mudança no cenário.  Para ele, é importante espalhar os lemas: “Deixe o óleo no solo, deixe o carvão no buraco, deixe a areia betuminosa na terra”.  É disso que se trata, acredita ele, quando se fala sobre o sentido de fazer política. “O objetivo da política é agir, mas agir com efeito”.  É a única maneira de ser protagonista, não meramente um espectador na vida.

 

“Não é um exagero, nem uma mera suposição:  é a conclusão central de um dos mais amplos projetos científicos já realizados. Precisamos começar a pensar no nosso planeta de um modo inteiramente novo”.

 

O livro merece reflexão.